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Foto do escritorTatiane Macena

Maria dos Prazeres dos Santos, a Flor do Sertão

Atualizado: 30 de mar.



A mestra em Ciências da Educação Maria dos Prazeres dos Santos, nasceu no dia 30 de julho de 1977, no povoado Ranchinho, situado no município de Porto da Folha. A terceira filha do Manoel Francisco (Maneca) e da dona Maria Francisca(Bebé) é bastante vaidosa. Só me permitiu tirar uma foto com a condição de que esta não fosse a capa de seu perfil. Prazeres passou a infância no povoado Umbuzeiro do Matuto, que também fica no sertão sergipano, voltou a morar no povoado Ranchinho com cinco anos e mudou-se para Aracaju quando era adolescente, pois ali onde morava só havia a possibilidade de estudar até o 5º ano (antiga 4ª série). Morou um período no conjunto Augusto Franco com sua tia, Maria Luíza e em seguida foi viver no bairro Santa Maria, onde ela, que é como uma borboleta, desenvolveu suas asas e levantou voo.

É uma grande responsabilidade discorrer sobre esta mulher que além de ser bastante carismática, tem um currículo bem extenso. Maria dos Prazeres dos Santos possui mestrado em Ciências da Educação pela Universidade Lusófona de humanidades e Tecnologias (ULTH-Lisboa), é especialista em Educação e Gestão pela Faculdade Pio Décimo (Pio X). Além de ser especializada em Psicopedagogia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Candeia (FAC) e em Educação, Desenvolvimento e Politicas Educativas pelo Centro Integrado de Tecnologia e Pesquisa(Cintep). Também é graduada em Pedagogia e Letras pela Universidade Tiradentes (Unit).


A educadora chegou a voltar as suas origens, tendo a honra de dividir a sala de aula com suas antigas professoras e fazer algo inédito: Ajudar a mudar o jeito de Porto da Folha exercer a educação. Quando a nossa audaz professora retornou ao município, encontrou a escola da forma que havia deixado (Com o ensino até somente a 4ª série do ensino fundamental), conseguiu através de muita batalha juntamente com a comunidade que o prefeito implantasse o ensino até o 9º ano (8ª série do fundamental). Atualmente, Prazeres trabalha na rede pública nas escolas Laonte Gama da Silva e Papa João Paulo. E é professora e diretora do Centro Educacional Sonho Meu (CESM). Maria dos Prazeres era uma criança sagaz. Quando tinha apenas 5 anos, esteve pela primeira vez em um espaço destinado a educação. Era uma banca, onde seus irmãos mais velhos estudavam. Quando a professora do local a conheceu, disse que ela era muito esperta e pediu para que o senhor Maneca comprasse um ABC para a garota que ficou fascinada e despertou ali, o desejo de se tornar uma professora. “Eu ficava encantada em saber o nome de cada letrinha. A partir daquele dia eu soube que seria professora”. Lembra ela.


Determinada, sempre correu atrás do que queria. Não se deixava abater quando alguém lhe dizia que ela não conseguiria algo, pelo contrário, toda força negativa era convertida em combustível e disposição para que essa mulher espetacular corresse atrás de seus sonhos. “Uma vez uma pessoa olhou para mim e disse que filho de pobre não fazia faculdade. Aqui estou eu com mais de uma formação e realizada.” Se orgulha Prazeres. Decidida, sempre soube que queria seguir na área educacional e influenciar sonhos.


Chegou até a passar um tempo atuando como agente de saúde, mas era somente enquanto estava no âmbito educacional, que se sentia plena. Começou sua carreira muito cedo, depois de concluir a primeira etapa do ensino fundamental (Da 1ª a 4ª série), auxiliava a professora Valdenizia Batista na preparação de aulas e testes, pois enquanto ela morasse ali não havia como avançar mais nos estudos e a garota não queria ficar longe da sala de aula. Aos 12 anos, mudou-se juntamente com sua família para a capital sergipana, a fim de dar continuidade a aquisição de conhecimentos. Quando estava perto de completar 15 anos, tivera outra alteração de endereço. Desta vez para o bairro Santa Maria, onde começou a ensinar banca em domicílio. Pouco tempo depois, foi convidada por uma vizinha, Eliene, para fazer parte de um projeto chamado Visão Mundial. O programa era oriundo dos Estados Unidos e tinha o intuito de promover educação para crianças carentes, ao mesmo tempo que também disponibilizava oficinas para os pais e comunidade. Fora ali, por meio de uma oficina de dança que a nossa protagonista conheceu a quadrilha junina.

A dança é uma paixão antiga da professora. O forró é uma cultura do município onde ela nasceu, por isso desde sempre esteve presente em sua vida. Frequentemente acontecia reuniões na casa de sua avó, onde Prazeres costumava dançar ao ritmo com sua família. Quando começou a fazer parte das oficinas do projeto Visão Mundial, descobriu-se uma amante da dança, hoje é integrante da campeã brasileira Assum Preto e ensina essa cultura junina por onde passa. Prazeres deu início a uma quadrilha em Porto da Folha. Quando passou em um concurso e foi trabalhar na localidade. Ficou no emprego de 2007 a 2012, período em que instituiu a quadrilha Flor do Sertão, que existe até a atualidade. O nome do grupo foi escolhido pelos alunos em homenagem a Maria dos Prazeres dos Santos, a nossa Flor do Sertão.

Quando Prazeres veio para Aracaju, dois dos seus irmãos já moravam na Capital. Eles vieram um pouco antes com o mesmo objetivo que a jovem: Em busca de um futuro melhor. Depois de um tempo, com muita luta, a Mãe da jovem conseguiu comprar um terreno para que pudesse construir uma casa e criar seus filhos. Antes da compra do local a dona Bebé havia tido um sonho no qual recebia a visita de Jesus que a abençoava. Atualmente no local funciona o Centro Educacional Sonho Meu (CESM).


A escola foi fundada no final do ano de 1998 por Prazeres e seus irmãos. Os garotos pediram a autorização da mãe para construir o colégio. A dona Bebé consentiu, então o grupo realizou algumas adaptações na residência (fechamento de algumas portas a fim de dar um maior espaço nas salas onde seriam realizadas as aulas.) e as atividades foram iniciadas em fevereiro de 1999 com quinze alunos e quatro educadores, Rosa Maria que trabalhava com educação infantil, Manoel Messias que ensinava para a 4ª série do fundamental, Lídia que dava aula para a 3ª série e a mestra em educação que na época ensinava língua portuguesa. A escola foi se desenvolvendo gradativamente. Com um tempo já disponibilizava aulas do ensino fundamental II e em seguida o ensino médio completo. Já são mais de vinte anos de existência e sucesso. Inclusive, alguns dos professores do Centro Educacional são frutos do trabalho do grupo.

No Laonte Gama da Silva, a professora exerce a função que muitos educadores não querem: O trabalho noturno com a juventude que muitas vezes é desacreditada pela sociedade, na educação de jovens e adultos (EJA). “A tarefa que faço à noite é linda. Além de eu cuidar deles, eles cuidam de mim. Infelizmente há professores que não aceitam ensinar aqui na comunidade por dinheiro nenhum. Por outro lado, aqueles que aceitam se apaixonam.” Diz a docente enquanto seus olhos brilham.


No ano passado os alunos do EJA fizeram um exercício muito bonito. Cada um deles escreveu à história de suas vidas em livros que foram lançados por eles no final do período letivo. São cerca de 8 anos trabalhando à noite. Nesse tempo, Prazeres foi conquistando a confiança dos estudantes. Até mesmo aqueles que não são seus alunos têm respeito por ela. É o caso da Luana Santos do Nascimento, aluna do Laonte Gama que faz questão de demonstrar seu respeito pela profissional. “Eu não tenho intimidade com ela, ainda assim ela conseguiu me motivar a nunca desistir dos meus sonhos. Prazeres é uma ótima pessoa de se conversar, afinal ela sabe ouvir.” afirma a estudante. A mentora sempre trata todos da mesma forma em todas as situações. Sabe como e quando elogiar e repreender. Para ela o ser humano vem antes de tudo. “Independente do estado que eles se encontram sempre os trato com compreensão. Quando é preciso repreender eu repreendo sem medo, sempre deixando claro que a bronca não é no individuo, mas sim na atitude. Isso ajuda a criar um elo entre o professor e aluno, que passa a entender que ele é querido. Eu sou aquela que dá a bronca, o beijo e o abraço ao mesmo tempo.” Brinca a educadora.

Quando não encontramos nossa Flor do Sertão mergulhada no mundo da educação, normalmente vamos encontrá-la ensaiando passos de quadrilha ou com sua tão amada família. “Além de estudar, gosto de dançar e cozinhar. Sempre que posso preparo refeições para receber meus irmãos. Acho que esses momentos são muito importantes.” Afirma ela. Religiosa, foi catequista na Capela Santíssima Trindade e esteve envolvida com os grupos de jovens enquanto morava no Augusto Franco. Caseira, não gosta muito de sair do conforto de sua casa, a menos que seja para estudar ou dançar quadrilha. “Não curto sair de casa, mas se houver algum curso na minha área ou uma apresentação de quadrilha, não penso duas vezes. Se for preciso atravessar o mundo para adquirir conhecimento, eu atravesso.” Afirma ela.

Arretada, nunca foi de ficar assistindo as coisas acontecerem, normalmente, atua em cada acontecimento de sua vida como protagonista desde a infância. Quando ainda estava em Porto da Folha, conseguia arrumar a casa, fazer comida, buscar água, pescar, e estudar antes que seu pai, Manoel Francisco voltasse de suas obrigações. “Eu conseguia fazer tudo isso e ainda tocar fogo no mundo. Quando meu pai voltava eu estava quietinha. E ele sempre dizia que eu era doidinha e pedia para Deus me abençoar.” Lembra a mulher com um sorriso no rosto. Prazeres possui o hábito de visitar a sua terra natal sempre que pode. “Gosto de ir ao sertão. Principalmente em época de inverno. Eu amo aquele cheirinho da terra molhada e tenho prazer em dar comida ao gado junto com minha mãe.” diz a sertaneja que afirma ter criado raízes no sertão de Porto da Folha. “Sempre que vou lá, peço ao meu pai para andar comigo pela terra, pois sinto que assim fortaleço as minhas raízes.” Sustenta ela.

Quando perguntada sobre inspirações, a Flor do Sertão citou um conjunto de nomes de professores que contribuíram para a construção da profissional que ela se tornou, mas fez questão de deixar claro que a sua maior influência é a sua mãe, dona Maria Francisca. “A minha maior estrela é sem dúvidas a minha mãe, pois ela sempre me incentivou. Ela acreditou em mim até mesmo quando não havia no que acreditar. A dona Maria tem cinco filhos. Todos formados com mais de uma graduação em nível superior. Ela é o meu maior exemplo. Já está idosa, mas continua com a mesma disposição. Se fica doente, logo se recompõe e volta à ativa. E eu sou igual a ela, quando quero algo, não desisto. Todas as noites quando a gente se fala por telefone, meu desejo é deitar no colo dela.” Expressa saudosa a filha da dona Bebé.

Solteira, nunca teve um relacionamento sério, pois sempre gostou de ser livre e não tem paciência para ficar dando justificativa de seus atos. “A minha mãe me deu asas e me ensinou a voar. Não quero ninguém pra cortá-las, pois sou espaçosa e lugar pequeno não me cabe. E além disso, eu sou bem exigente quanto ao cumprimento de promessas. Se um homem marca algo comigo, ele tem que cumprir, se não perde credibilidade. Para me conquistar ele tem que ser muito macho e inteligente. Isso está em falta no mundo.” Declara a mulher que gosta de ter pessoas ao seu lado, porém é um pouco seletiva quando se trata de relações pessoais. "Trato todos de forma igualitária, no entanto seleciono quem pode fazer parte da minha vida pessoal. Até porque eu sou carinhosa e gosto de reciprocidade. Não acredito que uma relação pode dar certo quando somente uma pessoa se dedica. Darei até meu último fio de cabelo por uma amizade, mas se eu cismar de algo, não tem oração que me faça voltar atrás. Para fazer parte da minha vida pessoal tem que merecer.” Declara.

Docente amada por seus alunos, Maria dos Prazeres acredita que o modelo ideal de professor é aquele que apoia o seu aluno, tem uma metodologia fácil de ser compreendida e que cria um vínculo com o estudante que estar além da sala de aula. “Ser professor vai muito além da escola. Não é sobre dar aula e ir embora, ou simplesmente passar uma atividade e esperar que uma criança ou adolescente faça tudo corretamente. Gosto de analisar a história de cada aluno e ver como ajudá-los. O que me encanta é isso, o enxergar o indivíduo. Acho cruel quando um professor não se doa totalmente para seu aluno. Eu sofri com isso enquanto estudante e por isso, tento fazer a diferença.” Desabafa a protagonista.

No primeiro semestre de 2020, Prazeres teve seu livro “O dilema da indisciplina escolar e as práticas pedagógicas”, publicado e lançado pela editora Appris. A obra tem como subtítulo “Um olhar para além da escola” e busca esclarecer que não há somente um responsável pela indisciplina escolar, mas sim um conjunto de fatores que contribuem para que haja ruídos entre orientado e orientador. A autora conta que a ideia de escrever sobre o tema é antiga. “Esse filho que eu gerei me acompanha desde meu curso de pedagogia em 2002. Tive uma professora que pediu para que os alunos fizessem uma pesquisa nas universidades, com o objetivo de descobrir sobre o que estava sendo produzido. Encontrei obras interessantes com diversos temas, mas somente uma falava sobre a indisciplina escolar. Foi a partir dali que comecei a estudar sobre essa temática.” Recorda a professora. Quando estava perto de concluir a graduação, deu-se conta de que não queria que sua monografia feita com tanto carinho ficasse apenas numa biblioteca, afinal assim poucas pessoas iriam ler. Por isso, decidiu continuar pesquisando e futuramente lançar seu livro.

O livro possui quatro capítulos. O primeiro fala sobre a indisciplina e os conceitos que a ela estão agregados, o segundo refere-se as práticas pedagógicas, no terceiro a escritora explora o contexto estudado e no quarto capítulo é onde está a grandeza da obra, pois a autora teve o cuidado de conversar com cada um dos envolvidos nessa vivencia. Foi entrevistando alunos, diretores e professores que ela conseguiu chegar à conclusão que prejudica o andar da educação na sociedade é o ciclo de apontar um culpado ao invés de tentar entender o que está por trás da indisciplina. “Muitas vezes sou mal entendida. As pessoas acham que estou sendo a favor do erro, mas não é bem assim. Sou favorável a compreensão. Tenho certeza de que se nós educadores, pais, professores e diretores parássemos para ouvir e entender o que está por trás da indisciplina, não haveria tantos casos.” Declara a educadora defendendo a sua tese. O livro pode ser adquirido nas seguintes livrarias: Escariz, Livrarias Curitiba, Livraria cultura, Martins Fontes Paulista, Livraria Loyola, Amazon, Submarino, Shoptime, Americanas e Magazine Luiza.

A flor do sertão sergipano acredita que cada indivíduo tem uma missão a ser cumprida na sociedade. “Ninguém está aqui para ser apenas um rostinho bonito. Há um plano de Deus na vida de cada um. Meu sonho é ver uma sociedade com mais igualdade na prática que na teoria. Quero um dia perceber que as pessoas menos favorecidas conseguem ter chance de realizar seus projetos. Fico muito feliz quando percebo que consegui fazer a diferença na vida de algum aluno. Estou cumprindo o meu propósito aqui. Se eu tivesse que voltar atrás, faria tudo do mesmo jeito.” Finaliza.


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